quarta-feira, 6 de setembro de 2017

PORQUE TARDAS, TIO PADRE?


Vejo à venda verduras que nós, lá na província, com vida agrícola, dávamos aos animais. 
Todos faziam isso, cortavam essas verduras para dentro de um balde, misturavam farinhas, figos seco, bolota, a primeira passagem de água pelos nossos pratos, para aproveitar o unto e engordávamos um porco.
O melhor alimento, o mais puro, o primordial, o que saía da terra, comida viva, era para engordar um animal, que se comeria aos bocados, portanto, cadáver...
Mas era o que melhor se poderia oferecer quando se tinha visitas ou se convidava alguém para almoçar ou jantar, era carne.
Quando optei por ser vegetariana, disse-o a um sacerdote meu amigo, uma das pessoas mais minhas amigas que tive na vida. Ele disse que desde há muito desejava deixar de comer carne, pois chegara à conclusão de que não lhe fazia falta nenhuma, que a pessoa que cuidava da casa dele e cozinhava, já sabia que ele não queria carne, mas o problema é que, devido à sua missão, tinha sempre paroquianos à espera que acabasse a Missa para o levarem a almoçar nas suas casas. E ele não podia recusar os convites nem o que lhe serviam, praticamente andava sempre a comer carne... Em casa, a cozinheira já sabia que ele não comia carne e, como era hipertenso, tomava medicação, mas estava sempre para o "alto", tinha de comer comida com pouco sal. Mas raramente comia em casa.
Bem já se sabe como era, toda a gente a preparar o cabritinho, o lombinho do porco, a galinha corada, tudo muito bem temperado, porque, depois, «convida-se o senhor padre no fim da missa!»
Naquelas alturas de Páscoa, ele andou acelerado, de freguesia em freguesia, com as celebrações, até que, finalmente, iria estar com a sua família, todos estavam felizes a aguardá-lo.
Entretanto, de véspera, ao final da tarde, um casal convidou-o para jantar. Ele aceitou. Depois regressou à casa dele e deitou-se, para descansar a noite e iniciar de manhã a curta viagem de carro que o levaria para o convívio com os seus entes queridos...
Estes, começaram a inquietar-se com a demora, passava já muito da hora que ele deveria lá chegar para iniciarem o almoço... Mas ele não mais chegaria...
Decorridos alguns dias, os sobrinhos mandaram para o jornal do concelho, do qual ele fora o Director, um poema, intitulado: «Porque tardas, Tio Padre?».
Quando li o poema já publicado no jornal,verti algumas lágrimas e pensei muito na falta da liberdade que as pessoas têm para poderem ser elas próprias, o terem de viver de regras, de compromissos com isto, com aquilo, com o ter de comer aquilo que não querem ou não podem, por causa de não serem criticadas, acusadas de não quererem conviver e, até começarem a afastar-se da Igreja, confundindo Deus com o Sacerdote...
Fl🌷rinda

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