domingo, 30 de outubro de 2016

JÁ NÃO RECONHEÇO O MUNDO ONDE ESTOU DEGREDADA

Já não reconheço este mundo onde estou degredada...

Chego a acreditar que dei um salto no tempo e pulei da anterior encarnação_da qual ainda guardo gratas recordações_ para esta, onde, agora, me encontro...
Hoje, tive de entrar num grande centro comercial, pois é lá que se situam  alguns dos estabelecimentos de produtos biológicos. E vi uma nova loja  de bordados, com  bastante clientela à espera. Aproximei-me.Vi quatro funcionárias  de carne e osso no atendimento e seis bordadoras compostas de metal e óleo a trabalhar...
E recordei o dia em que, após  o profissonal me fazer um exame total ao esqueleto, me ter perguntado a minha profissão, e eu lhe dizer: «bordadora à máquina», e de ele me ter respondido que assim já compreendia o  motivo de eu ter uma diferença nos joelhos de perto de 15 a 20 anos mais jovens e bem conservados em relação ao resto.  A movimentação diária no pedal da máquina tonificava-os.
E eu vivia feliz...
Agora, as "bordadoras" aceitam o trabalho e ficam a olhar para uma engrenagem de ferros a bordar...
E não vivem felizes...
As crianças dos meus antepassados andavam sempre sujas, não havia infantários com a super-higiene, o "infantário" delas   era o campo, onde brincavam livremente, enquanto os pais trabalhavam arduamente  na agricultura após as retirarem dos seu "veículos" de transporte, o cesto onde as mães as transportavam em cima da cabeça... Ou os pais, nos alforges dos burros... Jamais deixaram morrer alguma, "trancada"  lá por esquecimento, como já tem acontecido neste mundo apressado onde agora me encontro, devido ao  estresse dos progenitores ou para irem praticar adultério...
De vez em quando, metiam-nas num alguidar com água quente e, com um pedaço de telha, raspavam-lhes  aquelas espécies de peúgas negras, que a acumulação da terra tinha criado... As crianças choravam, doía-lhes, mas  a dor passava e.... eram felizes!
Seus pais e avós molhavam um dedo em água para tirarem a remela dos olhos, e lá de vez em quando, lavavam o corpo todo com uma pouca de água dentro de um alguidar, porque esta era escassa, ainda não sabiam explorar os recursos naturais da pobre Mãe Terra, de forma agressiva, como viria a fazer-se muitíssimos anos depois, pelas  gerações predadoras seguintes.
Eles limitavam-se a minar até aparecer água, encaminhar esta para poços que construíam com as suas próprias mãos e alguns artefactos, essa água era tirada através de picotas (engenhoca com um peso num lado e um gancho no outro, onde enfiavam um balde de  ferro ou zinco), pelos membros da família, homens e mulheres, com enorme esforço, a puxarem os baldes cheios de água a cada manobra... Depois de regarem a horta, transportavam alguma em cântaros de barro, quase sempre os homens ao ombro, as mulheres tinham de se encarregar novamente das crianças, o burro tinha de transportar  os produtos da colheita, às vezes por vários quilómetros...
Chegados a casa, as mulheres cozinhavam, os homens rachavam os troncos das árvores secas, erguendo o machado e deixando-o cair vigorosamente no tronco, previamente serrado em pedaços menores, para terem lenha para  a lareira. E diziam que só o facto de erguer o machado,  fazia entrar muito ar para os pulmões. Diziam o mesmo a respeito da ferramenta de cavar o chão, para as sementeiras.
As crianças juntavam-se todas por ali, à porta umas das outras, para brincarem ao "esconde-esconde" ou outro jogo qualquer que iam inventando.
E eram felizes...
Agora, neste planeta onde me encontro (devido a qualquer engano), vejo as famílias carregadas de comida já pronta, para aquecerem num dos piores inventos que apareceram para destruir a saúde, esses tais micro-ondas...
Vejo-as a irem aos ginásios malhar duro nas engenhocas completamente inúteis, que foram inventadas para sacar o dinheiro dos incautos, pois já fizeram testes, os músculos tipo mamas dos seus frequentadores são mais fracos dos que os naturais de alguém que os utiliza para trabalhar, fazendo algo produtivo... Provavelmente, só o trabalho terá a bênção do Altíssimo, o resto é considerado inutilidade...
A crianças, após chegada do infantário-redil, ficam, na sua maioria, metidas em casa, a ver televisão ou a jogar no computador jogos de guerra, porque é violência que os donos dos rebanhos querem que seus cérebros absorvam, para, mais tarde, se tornarem as assassinas-robôs, controladas à distância...
Aos fins-de-semana (algo que meus antepassados não conheciam, trabalhavam duro sem calendário), vai a família inteira passear pela "natureza" de qualquer centro comercial, parecem zumbies, a empurrarem um carinho e atirarem com tudo o que cobiçam lá para dentro...
E todos, tanto os pais como os  filhos, são infelizes!
No tempo dos meus antepassados, a autarquia limitava-se a um homem escolhido pelo povo da aldeia, o Regedor. Não  tinha salário. Era a ele que se dirigiam para resolver qualquer conflito. Se era grave, lá ia tudo, a cavalo nos seus burros, a caminho da sede do concelho,  ao posto da Guarda Republicana, depois de uma caminhada na burricada durante  mais de metade do dia, pois era uma longa distância.
No tempo dos meus antepassados, ainda não tinha sido inventada a maldita competição!
Agora, as autarquias  começam desde cedo a incitar os adolescentes a competir entre si, com  o falso conceito de «desporto é saúde, deporto é convívio e por aí fora...» e, para isso, têm de encolher as verbas destinadas às necessidades básicas, tais como saneamento básico e bons acessos onde eles fazem falta.
Mas isso não faz vista, meter o gado miúdo num redil, a  combater-se entre si, com grande publicidade e assistência a incitar e a aplaudir, cria muito mais impacto nas mentes obtusas, que são essas que interessam ao Patrão-mor, aquele que está oculto, mas que, brevemente, será esmagado dentro do próprio bunker que mandou construir para se esconder a si, à sua família e  aquilo que nos têm roubado.
Acaso alguém nota felicidade no olhar de toda essa juventude?
Apáticos... cabeça baixa, sempre ligados, aos encontrões a toda a gente... De vez em quando, ao passarem por nós dentro de um transporte público, se baixam a cabeça e roçam a cara  na nossa roupa, lá ficamos presos ao seu  material  metálico decorativo repulsivo, que não podemos puxar, para não ficarmos  enfeitados de nacos de carne humana...
Tudo o que tenho dito dos meus antepassados refere-se, apenas, até aos bisavós, que me era contado pelos meus Padrinhos, que substituíram meus pais na minha criação.
Não quero dizer que era totalmente bom viverem naquelas condições, mas o progresso tinha de ser feito de forma a não excluírem Deus  dos seus projectos... Assim, naquela época, as pessoas eram felizes apenas porque estavam vivas e anda ligadas ao Alto.  Meus familiares nunca mencionaram missas nem igrejas, estas  já existiam desde a antiguidade, mas em grandes cidades.
Nas aldeias, principalmente depois do caos em que as invasões francesas as deixaram, na sua retirada de Portugal, roubando e incendiando o que não podiam levar, foi tamanha a miséria, que nem casebres tinham para se resguardaram  das intempéries (valeu a alguns camponeses esconderem-se em minas de água que só eles conheciam, levando sementes consigo, que, depois, viriam a repartir entre si, para continuarem a semear a sua sobrevivência. E só quando deixavam de ouvir os franceses dizerem, a imitar a nossa voz: «Ó Maria, anda, anda, que aqueles malvados já se foram embora!» é que saíam. Os franceses  imitavam a  nossa pronúncia para que as Marias aparecessem, para as violarem..), como podiam construir igrejas?
Anos mais tarde, lá se começaram a construir e, mais recentemente, através de  donativos da própria comunidade, na minha aldeia (hoje já freguesia), conseguiram que fosse colocado um relógio na torre da Igreja.
E qual era a prioridade na altura...?
Pode parecer muito estranho, em tempo de carregar no telemóvel e ver as horas, mas, naquele tempo, nem relógios de pulso os camponeses tinham... Como precisavam regar as suas hortas,  num vale perto do aglomerado populacional, nesta altura já através de um tanque para onde a água corria desde a nascente e, devido a serem muitos os beneficiários dela, tinham que repartir por horas, o relógio facilitou a vida a muitos camponeses. A partir da colocação do relógio, começou a ser mais fácil, pois a rotação ia atingindo todos durante a noite, quando lhe competia  ir regar, com uma lanterna de petróleo e, ao terminar a rega, fechar a saída desta para ficar a  encher  para o vizinho seguinte...
Vida dura, não? Sim, mas todos sorridentes, felizes por estarem vivos...
As suas caminhadas eram as do trabalho para casa e de casa para o trabalho. Assim que escurecia, um serãozito à lareira, aqueciam-se e deitavam-se, o azeite da candeia tinha de ser poupado, não se podia gastar muito,  fazia  falta para temperar os alimentos, e o petróleo,  bastante caro e escasso, era guardado como ouro...
Actualmente, fazem-se caminhadas de noite, completamente infrutíferas, não se vai nem vem do trabalho, para estas "caminhadas" tem-se os transportes públicos ou o popó pessoal que caminha por elas... Depois: «Não dormi nada esta noite, que horror!»
E não são felizes!
O trabalho diário, que mantinha o ser humano activo, com mais saúde e a ganhar o seu sustento, foi-lhe criminosamente roubado e substituído por máquinas ou robôs falantes, nos atendimentos, venda de bilhetes etc... Passaram a receber (sem culpa alguma de estarem no desemprego) subsídios através daquilo que os poucos que trabalham descontam, para uma Instituição que está em crise e morte anunciada, desde que, por um "lapso de memória", esqueceram que não se pode tirar nada de um saco sem deitar mais para dentro dele, pois breve ficará vazio.
Agora, com tantos meios disponíveis para tudo, anda todo o mundo cabisbaixo... Parece que ninguém é feliz.
Mas voltando às Igrejas...
Apesar de estas não existirem lá na aldeia no tempo dos meus antepassados, estes estavam mais ligados a Deus do que actualmente a maioria dos que se dizem crentes.
Havia sempre uma mulher que exercia o que, hoje, é conhecido por catequese.
Quem se sentia atraído por ouvir a Palavra de Deus, ia às reuniões que essa mulher fazia na sua própria casa, onde ela falava sobre parte dos Evangelhos, que iam sendo transmitidos verbalmente de geração em geração, pois eram palavras simples, sobre conduta moral, aquilo que  agradava ao Senhor.  E estou convicta de que, mesmo sem Bíblia na mão, sem insistirem em dogmas bolorentos e ultrapassados, essas mulheres eram bem mais puras e ensinavam muito mais sobre o Divino, com os seus exemplos, do que algumas catequistas "prafrentex", que "ensinam" sentadas o colo dos seus namorados...
Pulando  no tempo, mas ainda em criança, recordo de começar a ouvir meus Padrinhos falarem no "sabido". Viria depois  a saber que era aquilo que todos os filhos concordavam entre si  entregar aos pais ou sogros, quando estes, já não podendo cuidar das propriedades agrícolas, as entregavam, para que fossem repartidas entre os irmãos. Do "sabido" (de saber-se o que devia dar-se), constava uma quantidade de alimentos e algum dinheiro, para o mais que precisassem.
Actualmente, muitos são os filhos que recebem o "sabido" dos pais, colocam estes num Lar-redil e nunca mais os visitam...
Os jovens do tempo dos meus antepassados  ajudavam os pais na agricultura...
E eram felizes e saudáveis. Não tinham  os mídia a infernizá-los  com as suas «publicidades-condicionadoras-de-mentes»...
Os jovens de hoje estão proibidos por lei, de trabalhar, até atingirem uma determinada idade... Mas podem estafar-se e aleijar-se, na chamada Educação Física, cujas exigências os obriga a desabrochar e inchar o seu egozito ainda virgem... Não conheço nenhum dos meus jovens amigos que não tenha andado a coxear e de canadianas!
Não podem trabalhar, mas podem correr completamente estressados, das escolas do Ensino Básico  para os estúdios, para os ensaios das telenovelas, onde eles vão aparecer uns escassos minutos como vedetas,  para orgulho das mamãs e dos papás...
Não podem trabalhar, mas podem  ensaiar, vestidos a rigor,  umas estocadas e uma farpas no cachaço de bezerrinhos, quase do seu tamanho, nas escolas de toureio, patrocinadas por energúmenos que são, por sua vez, patrocinados com os nossos impostos...
Conheço tanta gente infeliz, que tenta uma purificação exterior para evoluír, metendo-se debaixo do chuveiro várias vezes por dia, consumindo a água que escasseia para tanta gente, rodeada de todas as porcarias perfumadas que os mídia lhes impingem, mas esquecendo-se de que muitos dos grandes místicos que se elevaram acima do cidadão comum procuraram viver longe da civilização, onde  a única purificação que nos pode elevar e evoluir, a interior, se encontra  junto da natureza, que é  onde os ruídos da barulhenta  (in)civilização não chega..
E essa, quanto mais esbanjar os recursos naturais, mais suja fica...
E desconhecem que, se souberem invocar a Chama Violeta e aplicá-a na sua vida  quotidiana, ela ajudará a manter seu corpo e seu lar limpos...

Não! Já não reconheço este mundo onde estou degredada...

Florinda Rosa Isabel


























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